Título: Gente nossa: personagens de Floripa - volume 1
Autor: Ricardo Medeiros
Editora: Dois Por Quatro
Ano: 2025
Páginas: 140
Prefácio: Paulo Clóvis Schmidt
APRESENTAÇÃO
Esquece-se de lugares, vozes, rostos, pessoas. Mas, se há preservação da história, a memória vive. Trazemos à tona sabedoria, cultura, costumes, tradições, arte, façanhas, talentos, vanguardismo, rebeldia.O volume 1 de “Gente nossa – personagens de Floripa” inaugura uma série para colocar em evidência pessoas que são fonte de inspiração e de reflexão sobre a nossa realidade. Sem livros, documentários e outros registros, ficamos desmemoriados, mais pobres. É tempo de valorizar nosso povo, seja ele do morro ou do asfalto. Uma memória latente dá sentido à vida.
O autor
PREFÁCIO
Paulo Clóvis Schmidt
Jornalista
Uma cidade não se faz apenas de prédios, asfalto, monumentos e gente airosa e ajanotada. Que o digam Macondo e Antares, para ficar em apenas dois exemplos. Uma cidade é feita, e muito, de figuras anônimas, mal percebidas, reparadas aqui e ali em situações atípicas ou quando sua presença fere o cotidiano insosso dos calçadões, galerias e centros comerciais.
Neste livro, o jornalista Ricardo Medeiros dá voz e vez a sujeitos que a cultura de elite classificaria como “fora da curva”, mas que permanecem firmes na memória dos florianopolitanos. Eles e elas deixaram um legado relevante e forçam as mentes a buscar substitutos, quase sem chance de encontrá-los.
Em ritmo e com a linguagem comum à reportagem, Medeiros conta histórias de pessoas do morro e das avenidas, do Carnaval e das academias, da cultura popular e do submundo onde a droga e a luta pela sobrevivência balizam vidas e destinos.
Como não ser tocado pela trajetória de foliões que deixaram sua marca nas vias públicas e na passarela? São relatos de sofrimento e superação, de perdas e voltas por cima, quando a existência permite uma reação a tempo de redimir trajetórias, no mais das vezes, marcadas pela pobreza de meios, em diferentes pontos da cidade.
Uma personagem que Florianópolis aprendeu a respeitar, e que continua muito citada, é a de Lurdinha da Loteria, assim chamada porque garantia sua subsistência vendendo bilhetes no Centro da cidade. Vendia loterias e sonhos, fiel a um modo de vida que não fazia concessões, porque apenas a ela dizia respeito. Convivia com seus males e suas dores de maneira estoica, conseguindo até fazer caridade com o parco dinheiro que ganhava.
Também dono das ruas da cidade, o ator JB Costa legou um trabalho intenso na promoção de eventos culturais – alguns deles riscados do mapa, vítimas do empobrecimento que marca a gestão pública nesta área crucial para a autoestima e para a economia local. Ao se vestir e declamar Cruz e Sousa nas esquinas e nos coletivos, JB mostrou a quem não sabia quem foi o grande poeta negro que deixou o nome gravado na história da literatura brasileira.
Do morro e das periferias vieram outras figuras caras à memória de Florianópolis. Erotildes Helena da Silva, a Nega Tide, desfilou sua beleza escultural e seu jeito despachado pela avenida e pelas repartições. Não seriam a cor e as raízes que a deixariam calada – e os prêmios que recebeu por suas performances na folia falam por si. Elas e outras carnavalescas foram precursoras do movimento negro que se fortaleceu em Florianópolis e que projetou sobretudo as mulheres da raça que hoje brilham na música, no teatro e nas artes em geral, enriquecendo a chamada economia criativa da cidade.
Também em função das festas de Momo surgiram nomes como os de Jesuína Adelaide dos Santos, a dona Geninha, que ansiava por ser freira e acabou como protagonista no samba, criando escolas e liderando – o que era raro para uma mulher em meados do século passado – ações que estraram para a história do Carnaval de Florianópolis; Lídio Augusto Costa, o Seu Lidinho, passista juramentado que enfeitava o centro histórico com sua presença; e Mário Norberto da Silva, o Marinho, que foi servidor público mas se projetou na promoção de eventos ligados ao samba.
Marisa Ramos e Bernadete Maria Taranto Piazza entraram para o rol das mulheres ousadas e corajosas que afrontaram o lado careta da cidade. Marisa, especialmente, marcou história ao exibir o corpo em traje de banho quando Florianópolis ainda apreciava ir à praia como quem vai a um piquenique no campo. A Praia da Saudade, no Continente, nunca mais foi a mesma depois que “Sophia Loren de Santa Catarina”, como era conhecida, rompeu com barreiras até então intransponíveis.
Comparada pelo colunista Beto Stodieck à atriz Marlene Dietrich, Dete Piazza atuou como agente cultural e também ousou nos trajes e nas ideias, algo que a Florianópolis comportada sempre reprimiu. Ser independente era uma afronta, e ela frequentava as colunas sociais não pelas posses e títulos, mas pelo estilo melindroso que encantava os alunos na sala de aula e os homens nas ruas da cidade.
Outro personagem que está no livro e continua sendo reverenciado é o do radialista Miguel Livramento. Nascido em Biguaçu, encarnou o típico manezinho que chegou ao rádio por acaso e ali fez longa, brilhante – e polêmica – carreira. Quem não lembra de seus bordões e das frases que usava nas transmissões de futebol, “inticando” com atletas e treinadores por suas decisões e passes bisonhos?
Por fim, com a capacidade de incluir quem é excluído, Ricardo Medeiros traz um depoimento eivado de arrojo e sensibilidade da moradora de rua Adriana Teixeira Coelho, a Drica, que por longo tempo fez das ruas e bueiros o seu teto. Vítima de abuso sexual e todo tipo de violência, ela prodigaliza impropérios que, acredita, sejam uma forma de demonstrar sua inconformidade com o mundo e com o destino que lhe coube.
Por esse mosaico de homens e mulheres que desfilam nestas páginas, o livro de Ricardo Medeiros é uma contribuição muito rica para a cidade. Uma cidade que vive, sim, de edifícios, convenções e sujeitos empertigados, mas também de gente simples que conduz o seu destino e ajuda a entender o ser humano em toda a sua complexidade.
SOBRE O AUTOR
O escritor Ricardo Medeiros nasceu em Joaçaba-SC, em 1963. Com exceção de quatro anos vividos no exterior para estudar, tem 46 anos de residência em Florianópolis. Recebeu o diploma de Cidadão Honorário da capital catarinense e o troféu Manezinho da Ilha Aldírio Simões. Cultuando personalidades exponenciais, é autor das obras “Zininho – uma canção para Florianópolis”, “Uda Gonzaga: a primeira-dama do Morro da Caixa”, “Os filhos de Juventina” e “Aldírio Simões: o Manezinho-maior”. Também assina “Dramas no rádio: a radionovela em Florianópolis nas décadas de 50 e 60” e “Caros ouvintes: os 60 anos do rádio em Florianópolis”.
Incansável em preservar memórias, lança o primeiro volume da série “Gente nossa: personagens de Floripa”, seu 14º livro, uma homenagem a outras figuras que entraram para a história da cidade.
Formado em Jornalismo pela Universidade Federal de Santa Catarina, em 1986, é doutor em rádio pela Le Mans Université, na França. Já lecionou em três instituições de ensino superior: Unisul, Estácio SC e UFSC. É assessor de Comunicação da Secretaria de Educação da Prefeitura de Florianópolis.
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